PATINETES, FÉRIAS, OUTONO
Ontem, o medo
Hoje a dor de garganta
Quem sabe o que mais amanhã cedo
quando tudo recomeça?
À noite, mais tarefas
21.12.08
14.10.08
ANTI-HERÓI
Hoje é segunda-feira e não vou trabalhar.
Tomarei um banho, vestirei algo leve. Vou entrar no carro e encarar o trânsito de sempre, mas só até o supermercado. Comprarei um pote de sorvete e um maço de cigarros, no cartão (quero manter a sensação de algum dinheiro no bolso).
Então, voltarei pra casa, e aqui passarei o dia, abusando do sorvete e da fumaça, assistindo à primeira temporada de Friends.
Sim, está tudo bem comigo. Sinceramente.
Hoje é segunda-feira e não vou trabalhar.
Tomarei um banho, vestirei algo leve. Vou entrar no carro e encarar o trânsito de sempre, mas só até o supermercado. Comprarei um pote de sorvete e um maço de cigarros, no cartão (quero manter a sensação de algum dinheiro no bolso).
Então, voltarei pra casa, e aqui passarei o dia, abusando do sorvete e da fumaça, assistindo à primeira temporada de Friends.
Sim, está tudo bem comigo. Sinceramente.
14.8.08
SONETO
Por quantas falas te fizeste surda
Por quantas vilas te fizeste coxa
Por quantos homens te fizeste sexo
Por quantos temas te fizeste muda
Por tanto medo te fizeste nula
Por tanto açoite te fizeste sonsa
Por tanto efeito te fizeste nexo
Por tantas noites te fizeste puta
Por tantas dores escolheste o ódio
Por ser somente te fizeste muita
Por ser veloz tu te fizeste lenta
Por teu rancor sobrou-te este fim mórbido
Que tua descendência não assusta
Na flor da idade já morreste seca
Por quantas falas te fizeste surda
Por quantas vilas te fizeste coxa
Por quantos homens te fizeste sexo
Por quantos temas te fizeste muda
Por tanto medo te fizeste nula
Por tanto açoite te fizeste sonsa
Por tanto efeito te fizeste nexo
Por tantas noites te fizeste puta
Por tantas dores escolheste o ódio
Por ser somente te fizeste muita
Por ser veloz tu te fizeste lenta
Por teu rancor sobrou-te este fim mórbido
Que tua descendência não assusta
Na flor da idade já morreste seca
13.8.08
MERCEARIAS MERCENÁRIAS
Troque de calçada se, numa dessas ruas do centro,
avistar uma mercearia mercenária
Não hesite a fuga se ouvir um chamado vindo
de dentro de uma mercearia mercenária
Nelas vivem os novos vermes!
Nelas constroem suas armadilhas os novos vermes!
Eles estão em toda parte, nos becos e nas avenidas
Nos paços e nas malocas
Eles são amigos da praga, e inimigos da arte
Eles são usurários - tome cuidado
porque nesta malandragem
– não duvide – somos todos otários.
Troque de calçada se, numa dessas ruas do centro,
avistar uma mercearia mercenária
Não hesite a fuga se ouvir um chamado vindo
de dentro de uma mercearia mercenária
Nelas vivem os novos vermes!
Nelas constroem suas armadilhas os novos vermes!
Eles estão em toda parte, nos becos e nas avenidas
Nos paços e nas malocas
Eles são amigos da praga, e inimigos da arte
Eles são usurários - tome cuidado
porque nesta malandragem
– não duvide – somos todos otários.
5.8.08
TRABALHO
Sinto algo verdadeiramente estranho pelas pessoas que parecem aceitar em suas vidas, com tranqüilidade, a assertiva de que a vida é o trabalho.
Certamente não as invejo, mas nem por isso deixo de sentir certo apreço, uma estima do fundo da alma por seu tão bem adaptado estado de espírito.
A mim, resta o aperto no peito de crer na existência de um sentido outro, possível e ainda velado, um fim para o qual tudo o mais seja meio, que não se esgote no esforço diário do ganha-pão.
Sinto algo verdadeiramente estranho pelas pessoas que parecem aceitar em suas vidas, com tranqüilidade, a assertiva de que a vida é o trabalho.
Certamente não as invejo, mas nem por isso deixo de sentir certo apreço, uma estima do fundo da alma por seu tão bem adaptado estado de espírito.
A mim, resta o aperto no peito de crer na existência de um sentido outro, possível e ainda velado, um fim para o qual tudo o mais seja meio, que não se esgote no esforço diário do ganha-pão.
29.7.08
25.7.08
5.6.08
CHEIRO
Num dia ensolarado de 1500, uma embarcação da missão exploratória portuguesa, comandada pelo almirante Pedro Álvares Cabral, recebeu a bordo o primeiro dos sinais que, durante aqueles próximos dias, comprovariam a proximidade da terra firme (afinal, navegar – sim – era preciso). O sinal a que me refiro ainda não é a terra em si, nem as nuanças barrentas na água, nem os galhos e folhas que a água trazia consigo desde o continente, nem mesmo os pássaros que rondaram os lusos. Falo do cheiro.
Isso mesmo. Substâncias odorantes, carregadas pelo vento quente daquelas paragens, foram o prenúncio de nosso brasileirismo. Cheiro de solo novo e fértil, cheiro de urucuzeiro e de veneno de urutu, de macaxeira e de flor de maria-sem-vergonha. Cheiro de pau-brasil, de fogueira, de cabana, de gente do mato.
O casamento arranjado entre o odor tedioso da água salobra e o cheiro sanguinolento do escorbuto finalmente deu descanso à tripulação para revelar a nova maravilha do mundo conhecido: o cheiro de Brasil.
Somente alguns dias depois tiveram lugar os primeiros contatos efetivos com a costa, e Portugal inaugurou o novo achado. Mas isso é outra história... O importante mesmo – a primeira impressão, aquela que ficou – foi, sem dúvida, uma experiência olfativa. A orgia provocada nos narizes europeus pelos temperos, tinturas, lavagens, minérios e fisiologias pré-cabralianas selou o destino deste país. Não fosse sua consistência, seu sabor, sua lascívia, sua divindade, e os portugueses talvez tivessem até desistido, dado às costas e tentado noutro lugar.
Diz a tradição que os índios pensaram ser deuses os primeiros portugas. Grande balela! Os índios simplesmente estavam lá, na deles. Se um desconhecido entrasse agora em minha casa certamente não acreditaria tratar-se de um deus, mas de um ladrão. Na verdade, após meses presos num navio de segurança precária, enfrentando a escassez de víveres e as feridas abertas pelo corpo inteiro, eram os portugueses quem necessitavam com urgência uma sensação beatífica, um consolo, como que vindo do céu. E nossos odores lhes prometeram este Éden! E por isso vieram para cá, e colonizaram o Brasil. E por isso escrevo em português.
Porque a primeira commodity brasileira no cenário internacional foi o cheiro.
O cheiro, meus amigos!
Num dia ensolarado de 1500, uma embarcação da missão exploratória portuguesa, comandada pelo almirante Pedro Álvares Cabral, recebeu a bordo o primeiro dos sinais que, durante aqueles próximos dias, comprovariam a proximidade da terra firme (afinal, navegar – sim – era preciso). O sinal a que me refiro ainda não é a terra em si, nem as nuanças barrentas na água, nem os galhos e folhas que a água trazia consigo desde o continente, nem mesmo os pássaros que rondaram os lusos. Falo do cheiro.
Isso mesmo. Substâncias odorantes, carregadas pelo vento quente daquelas paragens, foram o prenúncio de nosso brasileirismo. Cheiro de solo novo e fértil, cheiro de urucuzeiro e de veneno de urutu, de macaxeira e de flor de maria-sem-vergonha. Cheiro de pau-brasil, de fogueira, de cabana, de gente do mato.
O casamento arranjado entre o odor tedioso da água salobra e o cheiro sanguinolento do escorbuto finalmente deu descanso à tripulação para revelar a nova maravilha do mundo conhecido: o cheiro de Brasil.
Somente alguns dias depois tiveram lugar os primeiros contatos efetivos com a costa, e Portugal inaugurou o novo achado. Mas isso é outra história... O importante mesmo – a primeira impressão, aquela que ficou – foi, sem dúvida, uma experiência olfativa. A orgia provocada nos narizes europeus pelos temperos, tinturas, lavagens, minérios e fisiologias pré-cabralianas selou o destino deste país. Não fosse sua consistência, seu sabor, sua lascívia, sua divindade, e os portugueses talvez tivessem até desistido, dado às costas e tentado noutro lugar.
Diz a tradição que os índios pensaram ser deuses os primeiros portugas. Grande balela! Os índios simplesmente estavam lá, na deles. Se um desconhecido entrasse agora em minha casa certamente não acreditaria tratar-se de um deus, mas de um ladrão. Na verdade, após meses presos num navio de segurança precária, enfrentando a escassez de víveres e as feridas abertas pelo corpo inteiro, eram os portugueses quem necessitavam com urgência uma sensação beatífica, um consolo, como que vindo do céu. E nossos odores lhes prometeram este Éden! E por isso vieram para cá, e colonizaram o Brasil. E por isso escrevo em português.
Porque a primeira commodity brasileira no cenário internacional foi o cheiro.
O cheiro, meus amigos!
28.4.08
VIRADO
A distância da censura seria o único controle remoto afetivo. E que apertasse forte os botões, que a pilha já tinha tempos.
Teu rosto, teus olhos, teu tudo em meu mundo. Uma fome profunda, uma quase gastura, e eu, à espreita do melhor dos banquetes, me entupia de pão e manteiga.
Já eu soçobrava.
Meu desespero mudo e medroso. O flagelo de sentir tão perto teu cheiro, e nem sinal de fragrância. Teus humores ressabiados, teus não saberes bem disfarçados. Tua insegurança plena, tua carne viva.
Teu chamego e, ainda assim, minha dúvida, meu não querer estragar o momento, como se o momento existisse... como se a vida não estivesse mais adiante, lá onde tudo acontece de verdade, sem tela nem página, a vida mesmo, quente e crua.
Se não fosse minha zelosa noção do ridículo... tudo teria virado!
A distância da censura seria o único controle remoto afetivo. E que apertasse forte os botões, que a pilha já tinha tempos.
Teu rosto, teus olhos, teu tudo em meu mundo. Uma fome profunda, uma quase gastura, e eu, à espreita do melhor dos banquetes, me entupia de pão e manteiga.
Já eu soçobrava.
Meu desespero mudo e medroso. O flagelo de sentir tão perto teu cheiro, e nem sinal de fragrância. Teus humores ressabiados, teus não saberes bem disfarçados. Tua insegurança plena, tua carne viva.
Teu chamego e, ainda assim, minha dúvida, meu não querer estragar o momento, como se o momento existisse... como se a vida não estivesse mais adiante, lá onde tudo acontece de verdade, sem tela nem página, a vida mesmo, quente e crua.
Se não fosse minha zelosa noção do ridículo... tudo teria virado!
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