27.5.04

ABSCISSA

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25.5.04

50 LETRAS

Vovô viu a uva.
Sugou o sumo suculento.
Cuspiu a casca e o caroço.

22.5.04

HERDEIRO

(Herdeiro de um mundo encantado, sem ânimo pra ver graça no cinza, no bege. Doando expectativas, como esmola, a toda gente. Nunca viveu no arco-íris, mas jura que conhece como a palma da própria mão. Recusado ao ordinário de pegar no batente pelo óbvio de cada dia, prefere o sono longo, que invade as horas da obrigação. Há certa prepotência. Sente-se um pouco bem, um pouco mal. Nem mais, nem menos.
Tem moral, sim, mas congelada no cerne de um iceberg de negações. Falta amor-próprio, sem sombra de dúvida.
Daí - sim - a prepotência. De onde mais?)

No meio da rua:
Ele: Senhor?
O outro: ...
Ele: Senhor?
O outro: Minha pessoa?
Ele: Sim. Faz-me a gentileza?
O outro: Pois não.
Ele: Onde estamos?
(Não vamos dar risada agora, ele não sabia mesmo)
O outro: Como assim?
Ele: Onde estamos, senhor? Faria a gentileza?
O outro: Na rua. Mora por aqui?
Ele: Não sei. Se eu moraria na rua?
O outro: Suas roupas estão sujas, rasgadas.
Ele: Vi. Acordei ali atrás, quase agora. O senhor me conhece?
O outro: Certamente não.
Ele: E eu, me conheço?
O outro: Pelo visto...
Ele: A guerra já acabou?
O outro: Lembra da guerra?
Ele: Não, sou homem de muita paz interior.
(Como podia saber? Esta história está ficando muito mal contada...)
O outro: Com sua licença, preciso ir. Quando você me parou, estava de passagem. Sou esperado.
Ele: Eu junto?
O outro: Não, você fica.
Ele: Fico onde, senhor? Perdoe a insistência, ainda não me disse onde estamos.
O outro: Fica assim. Não mexe o corpo. Senta um pouco, talvez.
Ele: Fico sim. Deus lhe dê em dobro.

(Aí está, bem como eu já imaginava. Não passava de um belíssimo filho de uma puta. Viram como ele manejou a situação? Viram como concebeu um zigoto de confusão na cabeça do pobrezinho? Inoculou uma praga de gafanhotos que evolui lenta e silenciosamente, comendo, uma a uma, todas as porções de segurança e bom senso.
Cuidado, vizinhos, muito cuidado. Há milhões desses esconjurados por aí.)

15.5.04

AMOR (2)

A doida esquálida na passarela?
Nada disso. Meu amor é de compleição maciça, carnes fortes. Quase bélica, violenta.
E passa rápido como raio – nem me vi.
Espero dela o que deveria vir do sol – a luz solar.
Estranho, ela se põe do lado oposto, quase inteira. Aurora boreal obsedada.
Parece que me acompanha, mas diz que é ilusão. Que ela fica lá mesmo – sabe o sol? – enquanto vago em torno.
Um culto ruidoso, veneração gratuita, um fascínio fenomenal.
Todas as letras de um nome composto: ela.
Tudo me deixa em cacos, cego. Diminuído, longe do que querer: melancólico. O sono vem na hora errada.
Não temo, porque o amor só liberta quando escraviza. Quando é de declarações e presentes exagerados. Quando toma por inteiro e faz de mim outra coisa. Quando é, também, devoção. Quando não importa a cor do cabelo, o esmalte das unhas, e não enoja um canto de boca brilhando de maionese.
Bem lembrado, nada pesa mais que um sentido. Na busca por ele, se mata e se morre, se passa uma vida labutando de sol a sol, se escreve poesia e memorandos, cartas de adeus, se geram filhos.
E se ama uma mulher. Simples e direta, eterna e profundamente.
Uma mulher que podia perfeitamente ser apenas mais uma, e até é, mas que, misteriosamente, enche com flores o odioso vácuo da vida.

9.5.04

MULHER

Minha mulher tem um frio na barriga
Tem cheiro de não-sei-o-quê
Voz que me procura
Um choro que não chora
Orgulho de ser ela
Batuque no peito
Olho enviesado
A mão mais macia
Um pé desenhado
Harmonia
Uma alegria sozinha
Asas que eu vejo
Toque completo
Tempero fino
Gesto impreciso
Pernas cruzadas
Expressão na carne
Dedos
Eletricidade
Levanta, levanto
Senta, deito
Vai, vou junto
Vem, já estou
Pega, é seu
Todo seu
Não larga
Me faz feliz (nunca fui)
Sem perceber

4.5.04

PERFIL

Roubar um beijo ou um banco: eis a questão. Maturidade afetiva de uma criança de colo. Almost de quatro. Por ora, é só o que me vem. Quem sabe um dia sintetize num gozo todas as porras do mundo. Talvez quebre a cara. Não seria por falta de costume. O coração arde e encarde. O telefone não pára de tocar. Não procurem. O perfil do candidato não deixa dúvida: organizado, boa dicção, asseado, conhecimentos desejáveis de Windows e Internet.
Conto os segundos. Ela caminha lateralmente despreocupada, nem aí comigo.
Engraçado, ainda ontem estava no sonho. Linda, sem sentido. Agora não parece tão de verdade. O suco de maracujá vai ficar para a próxima... Encarnação.

1.5.04

CRISTO

Fiz o Cristo aqui do lado esquerdo, do coração. Ele que disse assim: quero ficar no teu corpo feito tatuagem, que é pra te dar coragem pra seguir viagem. Disse tudo e quase nem piscou, ficando bem solenemente.
Fiz nem pra talismã, nem pra amuleto, mas se quiser funcionar, não ligo não. É mais pra não esquecer nunca quem é que manda por aqui. Alguma dúvida? Isso mesmo.
Se quiser castigar, vai, castiga. Lança praga sanguinolenta, atrai sofrimentos de um mundo. Ou já me leva logo embora, então. Quer ouvir da minha boca? QUERO QUE SE FODA.
Revoltado não, que eu não sou moleque. Você que pensa que sabe da vida. Ôôô! Tinha já uma cicatriz no coração, aí outra na cabeça. Cicatriz como desenho do destino.
Fui lá e falei: faz um desenho bem bonito, depois pinta com cores e deixa o tio ver. Só não pode usar canetinha, que suja a roupa e mancha e a mãe reclama que só trabalha e ninguém tem um pingo de consideração e quer ver o dia que ela morrer como é que vão se virar.
Tinge, rasgando em preto, a pele. Faz do avesso, começa pelo verso. Depois rega de azul piscina a menina dos olhos. De rosa, a flor do cabelo. Vem de laranja nos desenganos.
Capazes eram os duendes, que só conheciam três cores: amarelo, azul ciano e magenta. Na Duendilândia nem tinha Aids, Hepatite C. Mas todas as casinhas eram iguais, e todos tinham o mesmo bronzeado. Foi nessa época que os duendes malvados roubaram as sete cores do arco-íris e não tiveram pra onde ir, tão beira-mar que era a terrinha.
Mas Jesus teve misericórdia, perdoando-os todos. Os duendes ladrões, sem certeza nenhuma na vida, voltaram atrás, se arrependeram, e entraram num reino dos céus bem pequenininho.
Veja se entende, há uma diferença: entre tudo que eu queria ser pra alguém e tudo que eu queria que alguém fosse pra mim.